Por: Andressa D’Amato
Pouco mais de três meses depois de fechar as portas, o restaurante Piantella, reduto de políticos e figurões de Brasília, reabrirá sob nova direção. Omar Peres terá a missão de resgatar o prestígio de um dos ícones da capital federal
O último dia de agosto foi marcado por importantes mudanças em Brasília. Enquanto Dilma Rousseff perdia seu mandato, o restaurante Piantella, que por 38 anos servira como plenário gastronômico de políticos e empresários, colocava à mesa sua última refeição. A ocasião reuniu clientes assíduos, como o ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso e o criminalista Alberto Toron, que não dispensaram a célebre galinhada. Mas o encerramento das atividades no dia do impeachment de Dilma não passou de coincidência.
“O fechamento já estava marcado para o último dia do mês e não podíamos mudar”, diz Antonio Carlos de Almeida Castro, mais conhecido como Kakay. Advogado mais procurado pelos políticos, ele se tornou o único dono, há três anos, depois de adquirir a parte do ex-sócio e fundador da casa Marco Aurélio Costa. Há mais de 15 anos, Kakay já fazia parte da sociedade do restaurante, que vinha dando sinais de problemas financeiros desde 2013. “Tentei salvar o Piantella, mas sou um péssimo empresário”, admite. Na segunda-feira 5, o restaurante vai reabrir.
Desta vez, sob o comando de um empresário do ramo, o mineiro Omar Peres, dono de ícones da gastronomia carioca, o Bar Lagoa e o restaurante La Fiorentina. O excesso de trabalho nos tribunais e sua ausência na gestão do restaurante agravaram ainda mais a situação do Piantella, que ficou, segundo ele, à deriva em meio à crise econômica. Com a operação Lava Jato, Kakay viu seu pouco tempo livre ir por água abaixo. O advogado passou a dar assessoria jurídica a 18 envolvidos, como o banqueiro André Esteves e a ex-governadora do Maranhão, Roseana Sarney. “Não tinha condições de acompanhar de perto o restaurante”.
O Piantella não é o único que sofreu com a crise. De acordo com dados da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), o setor deve cair 5,5% em 2016. “Em Brasília essa perda é nítida. Em época de Lava Jato, os políticos não querem ser vistos ostentando. Preferem gastar em celebrações particulares”, diz Rodrigo Freire, presidente da Abrasel do Distrito Federal. O Piantella viveu seu auge entre os anos 1980 e 1990, quando passou a ser frequentado por políticos. Ulysses Guimarães era um dos clientes mais fiéis. Entre goles de poire, destilado francês à base de pêra, Guimarães articulava por lá a campanha pelas Diretas Já.
Ele costumava sentar-se em um canto mais reservado do restaurante. Mesmo depois de sua morte, em 1992, sua mesa e cadeira continuaram reservadas com seu nome, e um quadro com sua foto foi pendurada na parede. Fernando Henrique Cardoso, Itamar Franco, Aécio Neves, Dilma Rousseff e Michel Temer eram figuras constantes no Piantella. “Era como se fosse uma extensão do Congresso”, diz Kakay. “Muitas vezes não fechávamos de madrugada para atender os políticos, que precisavam fazer reuniões emergenciais”, relembra. O ex-presidente Lula também era fã do Piantella. “Quando ele ganhou as eleições, em 2002, fez questão de jantar na casa com mais dez ministros. Foi uma festa”.
O restaurante também foi palco de histórias curiosas. “O Luis Eduardo Magalhães tinha uma tática boa para não o flagrarem com bebida alcóolica. Ele não tomava champanhe em taça, mas em um copo diferente”, relembra, aos risos, sobre o popular político baiano, ex-presidente da Câmara, morto em 1998 depois de sofrer um infarto. Mas a clientela vai além do meio político. Segundo Kakay, a casa também é bem vista por moradores de Brasília e região. “Costumamos brincar que no Piantella o governo e a oposição sentam-se à mesma mesa”, diz.
Cenário de tantas histórias, era esperado que o Piantella fosse reabrir um dia. Pelo menos, esse sempre foi o plano de Kakay, que fez questão de manter o restaurante intacto e continuar pagando o aluguel do ponto. Semanas após o fechamento, surgiram várias propostas de sociedade e de compra. Mas nenhuma – até o mês retrasado – chamou sua atenção. O empresário Omar Peres, conhecido como Catito, fez a proposta que traria o Piantella de volta à cena. “Ele me convenceu com o discurso que não tinha interesse em se tornar sócio, mas sim em ser o único dono. E garantiu que iria manter o restaurante igual, com a mesma decoração, equipe e cardápio”. Catito é uma figura bem conhecida na gastronomia carioca.
Mineiro, ele se mudou para o Rio de Janeiro aos 4 anos. Hoje, aos 59, pode se orgulhar de seu império. Ele é dono dos consagrados Bar Lagoa, do restaurante La Fiorentina, e das padarias Guerin. Fora da gastronomia, Catito tem imóveis residenciais e empreendimentos comerciais, que juntos valem cerca de US$ 100 milhões, de acordo com uma recente declaração do empresário. Em janeiro de 2017, ele se prepara para reabrir, com o empresário Ricardo Amaral, a boate Hippopotamus, que funcionou por 26 anos e fechou em 2001. “Costumo dizer que sou um empresário multifacetado do setor de entretenimento.
Gosto de comprar ícones que contam a história da cidade”, diz Catito, que pretende tomar conta do negócio bem de perto. “Principalmente no começo, vou ficar a maior parte do tempo em Brasília.” A única mudança do Piantella será na parede do bar. “Sugeri fazer um mural com 250 fotos de políticos, a maioria do fotógrafo Orlando Brito, que já passaram por lá. Será um atrativo para quem ainda não conhece o restaurante.” Sem outras mudanças ou adaptações, até mesmo o preço será mantido. O tíquete médio na casa fica em torno de R$ 200, fora o vinho.
“O Piantella, por si só, já é um ícone. Não precisa de mudanças. A comida e o atendimento são excelentes, e a crise não será permanente”, diz Catito. Para Enzo Donna, diretor da consultoria EDC Food Service, a reabertura da casa promete ser um sucesso. “Acredito que por ele ter uma carreira bem sucedida na gastronomia, ser um garimpador de boas oportunidades, o restaurante tem tudo para continuar dando certo.” Pela vocação empresarial de Catito, o Piantella tem todas as chances de voltar a aglutinar situação e oposição em Brasília.